terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Carta ao Educador_Um sentimento, um grito... Hoje foi difícil!

Rio de Janeiro, 24 de fevereiro de 2015


Amados,

          Hoje minha escrita expressa uma necessidade em compartilhar sentimentos vividos nesta manhã e início de tarde... Talvez um grito de desabafo! Mas acima de tudo uma reflexão sobre a prática educativa e seus muitos desafios. Certamente alguns se identificarão...
             
             Então o relógio desperta, já é hora de levantar! Pouco tempo depois lá estamos nós, sorrindo e cumprimentando nossos colegas de trabalho. É hora do "bom dia" e do olhar que acolhe. Adentramos a sala de aula... Coração esperançoso, confiante pelo tempo produtivo que desejamos viver! De outro lado, vozes ansiosas por compartilhar as horas antecedentes... Assim começa o nosso dia!
         Horas se passam... E no movimento cotidiano de idas e vindas, esbarramos com posturas, atitudes e ações diferentes, umas gratificantes, enriquecedoras; enquanto outras desastrosas, preocupantes, entristecedoras e desanimadoras. Somos educadores, mas antes, somos seres humanos; porém com uma dose extra de sentimentos, de idealismo e crença na transformação humana. Sonhamos em ajudar a construir um mundo melhor, cidadãos com maior consciência e responsabilidade social. Por isso, muitas vezes sofremos... 
              Tem dias em que tudo acontece e a atmosfera acinzenta-se! Hoje foi um desses dias.
          Tenho uma turma com nível de aprendizagem em pontos extremos e absurdos. Alunos sem limites de educação, agridem, ofendem, desafiam e perturbam a paz e a alegria presentes no início do dia.  Ainda não desenvolveram habilidades básicas de um estudante de início de 3º ano. Muitos ainda não compreenderam a dinâmica de uso de um caderno, desconhecem conceitos básicos de aprendizagem, apresentam dificuldades de localização espacial, assim como desconhecem a dimensão do seu próprio corpo. Mas há aqueles que demonstram excelência em todos os aspectos, inclusive na paciência com o cenário atual!
           Paralelo a este movimento, há um aluno com problemas sérios de saúde... Uma bomba relógio pronta a explodir! E explodiu em meus braços, no instante em que dava a saída da turma. Estes, aliás, revelaram-se trêmulos e doloridos até o anoitecer. O corpo, após amparar tamanha tensão, apresentou dores em diferentes pontos. Já o coração experimentou sentimentos diversos...
          Mas o movimento do dia não se resume a estes acontecimentos. Antes de seu ápice, alguns alunos foram encaminhados à secretaria porque passavam mal. Vários incêndios surgiram e necessitavam ser apagados de uma só vez, num único instante... Em meio a crise, uma aluna clamou " tia, por favor, continua a explicação, vamos estudar!". O coração apertou! Como atender a todos? Como saciar tantas demandas distintas ao mesmo tempo? Impotência, este é o sentimento que fica!
             Tem dias em que as lágrimas vem à tona, impossível controlar! Então, junto vem o desejo de parar, sentar, observar, escutar o silêncio... É como se buscássemos enxergar cores em meio ao vazio... Refletimos sobre nossas ações, questionamos nossas atitudes, ponderamos nossos sonhos e ideais, colocamos na balança nossos anseios, planejamentos, possibilidades e realidades... Então, somos acometidos pelo sentimento de que não há nada a fazer... O desânimo se apossa de nós!
          Lembrei-me então de uma "educadora" que me apontou negativamente como alguém que oferece demasiados conceitos aos alunos, sugerindo que seguisse apenas a "cartilha" da rede de ensino a qual faço parte. Claramente mostrou-se oposta a pedagogia por projetos, a qual tenho grande apreço. Por um instante cheguei a pensar que sua colocação era correta e adequada a realidade... 
           Mas em contraponto, lembrei-me também que a engrenagem que me move e me oferece forças para prosseguir é a minha inquietude, o meu olhar e postura de pesquisadora, as palavras que me saem da mente, as idéias que comumente afloram em mim; além das muitas experiências profissionais já vividas por este Brasil, as quais revelaram a possibilidade de transformação e desenvolvimento do ser. 
          Sim! É possível transformar!!!
       Voei, atravessei fronteiras, naveguei rios, caminhei horas... De leste a oeste, de norte a sul, conheci a educação em sua essência em diferentes regiões do Brasil. Vi transformações reais, ouvi depoimentos impactantes de alunos e educadores. Sim, a educação pode transformar! Sim, eu posso mudar esta realidade!
         O processo de mudança por vezes é doloroso, mas não é impossível! Inicialmente pensei em abrir mão do belo projeto que escrevi para esta turma, dos sonhos que desejei despertar neles e das vivências que planejei para eles... Mas não! Não tenho o direito de fazer isso! Amadureci! Decidi que não vou sofrer. A dor se transformará em energia, força motriz para a realização de ações pedagógicas importantes. Adaptações serão necessárias, assim como a consciência dos limites, na certeza de que o melhor alcançaremos juntos!!
           Neste momento só me resta agradecer à Deus pela vocação de ser educadora; às pessoas que ao longo da minha vida me ensinaram a sonhar e a acreditar numa educação transformadora; e hoje, especificamente, necessário agradecer àquelas que me ajudaram a enfrentar os momentos difíceis.
           Por fim, o sentimento que fica é de FÉ! Não podemos desistir!!

          Deus abençoe e proteja nós, educadores!!

          Grande Beijo ao coração!

          Carla Rodrigues.  



Um comentário:

  1. Amiga, se fizéssemos o mais fácil não seríamos educadoras. Sei que tem horas que pensamos em desistir, mas respire, chame as amigas, compartilhe, sonhe... conte comigo!

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